Terminal...
Como acontecia habitualmente naquele local, a minha espera pelo transporte durava já longos minutos. Com a frequência habituamo-nos a reconhecer as pessoas que passam às mesmas horas nos mesmos locais, especialmente locais como este – interfaces de transportes.
Não sei porque motivo, ou talvez por nunca a ter visto por ali, naquele fim de tarde uma mulher em especial captou a minha atenção e comecei a observá-la. Talvez fosse pelo olhar errante com que corria a plataforma, ou pelo abrir e fechar constante do livro que ora abria ora atirava com violência para cima do banco ou ainda, pelo modo como torcia as mãos cuidadas. Acabei por perceber que estava nervosa, por algum motivo estava muito nervosa...
Fora do terminal a chuva caía violentamente contra os vidros e, as pessoas que entravam tinham o ar de quem finalmente encontra um porto de abrigo no meio da tempestade. Ela já devia estar ali há algum tempo pois não aparentava o ar de quem tinha apanhado chuva. De cada vez que chegava um determinado comboio os olhos dela deixavam de ser errantes e tornavam-se perscutantes, inquisidores durante breves instantes, como quem procura alguém. Quando o comboio partia novamente notava-se alívio mas também alguma desilusão no modo como se encostava no banco e respirava fundo.
Mais uma vez abriu o livro para voltar a fechá-lo de imediato, com violência, quase atirando-o para o chão. Creio que tentou roer as unhas mas, aparentemente não sabia como fazê-lo pelo que voltou a torcer as mãos.
Chegou um novo comboio e de novo o seu olhar se tornou inquisidor, mais atento mas, dessa vez foi diferente. Não sabia o quê mas, pelo sobressalto, percebi que viu o que estava à espera.
Pôs-se de pé num salto e avançou até às escadas por onde começavam a emergir as pessoas que tinham descido daquele comboio. Num gesto tipicamente feminino e nervoso ajeitou a roupa e, fazendo do vidro espelho, alisou o cabelo.
Vi que respirou fundo quando deu três passos em frente, colocando-se no caminho daquele homem que tinha acabado de chegar ao cimo da escadaria. Vi que absorto nos seus pensamentos ele não a viu de imediato. Vi que com um passo para o lado ele fez tensão de se desviar de quem lhe atrapalhava o caminho. Vi que ela lhe acompanhou o movimento. Vi-o levantar os olhos e vi o modo como a olhou. Vi que a surpresa foi impossível de disfarçar. Vi que ela disse algo que ao longe interpretei como um “olá, como estás?”. Vi que ele passou a mão pela cabeça sem disfarçar a surpresa. E depois...
Depois não vi mais nada! O meu transporte finalmente chegou e fui obrigada a abandonar o meu posto de observação. Quando passei por aquele par estavam ainda os dois imóveis no cimo da escada. A surpresa ainda estampada no rosto dele, o dela agora um pouco menos tenso, dava início de um esboço de sorriso.
No meu caminho para casa pensei em como gostaria de conhecer o final daquela história.
2006.11.20